RACHEL DE QUEIROZ NÃO GOSTAVA
DE OLHOS AZUIS. NEM DE BLUMENAU !
Não se pode negar: entre as mulheres que desenvolveram seus pendores literários e intelectuais no Brasil a escritora Rachel de Queiroz foi imbatível.
Claro que naquela época a
realidade era outra, mas que não deveria ser assim. Muitos pós guerra vieram
com ódio, outros com revoltas, mesmo alemães contra alemães. Então os
comentários da nossa grande Rachel da época refletia uma realidade, do qual
sofreu protestos seu pronunciamento.
Também creio que depois ela possa ter refletido e pensado de outra forma.
Adalberto Day
Por Carlos Braga Mueller
Não se pode negar: entre as mulheres que desenvolveram seus pendores literários e intelectuais no Brasil a escritora Rachel de Queiroz foi imbatível.
Mas houve época em que ela, escrevendo
semanalmente na revista "O
Cruzeiro", naquele tempo a mais importante do país, resolveu assestar sua pena contra os
"olhos azuis" dos
blumenauenses e demais moradores da região do Vale do Itajaí.
O QUE RACHEL ESCREVEU:
No artigo que escreveu sob o título
"Olhos Azuis" e que foi
publicado no dia 19 de março de 1949, entre outras considerações, Rachel começa dizendo: "Nem parecem olhos de brasileiros aqueles
olhos azuis com que nos fitam as gentes
de certas zonas do sul."
Rachel de Queiroz
Depois assevera:
"Quem anda pela chamada "zona
alemã" dos estados do sul, e especialmente
pelo "Vale do Itajaí", em SC, a sensação que tem é de estar em país estrangeiro,
e país estrangeiro inamistoso."
Revela também sua preocupação pela presença
alemã por esta região, escrevendo:
"Se há, pois, quisto racial ainda em
plena exuberância, é aquele. Aquilo não
é Brasil, ou se o é, é Brasil
transviado. Brasil em mãos alheias".
Ao final, a escritora recomenda:
"Alguém tem que dar um jeito nesse
problema enquanto ele não se vira
drama."
AS REPERCUSSÕES EM BLUMENAU
Claro que a leitura deste artigo na mais
importante revista brasileira criou um
nó na garganta de todos em Blumenau.
O prefeito, que era Frederico Guilherme Busch
Jr., enviou carta à escritora,
repudiando as críticas.
A Câmara Municipal de Vereadores recebeu cópia
desta carta e por proposição do então
vereador Herbert Georg foi aprovado um
requerimento de protesto contra o artigo de
Rachel de Queiroz.
A Câmara de Vereadores de Indaial apoiou a
posição dos colegas blumenauenses, o
mesmo acontecendo no legislativo de
Brusque.
Não só Blumenau, mas o Vale do Itajaí estava
em pé de guerra contra a escritora.
Na Câmara Federal, o deputado blumenauense Max
Tavares D'Amaral fez um veemente
pronunciamento, também protestando contra
as colocações da escritora.
Mas ela não estava nem aí para os protestos !
Escreveu ainda outro artigo desairoso contra
os alemães de Blumenau, desta vez
intitulado "Nacionalização do Vale do
Itajaí", invocando depoimentos de militares que durante a segunda guerra mundial participaram do
processo de "nacionalização"
da região. Esta nova investida foi
publicada no jornal carioca "Diário de Notícias" de 3 de abril de 1949.
CICATRIZES
Depois disso, Rachel de Queiroz ainda escreveu
sua coluna durante muitos anos na revista
"O Cruzeiro", sempre na última
página. Era nordestina, como nordestino era Assis Chateaubriand, dono da revista e do grupo de
jornais, rádios e televisões conhecido
como "Diários Associados", ao
qual pertencia, inclusive, o jornal diário "A Nação", de Blumenau.
Não se tiram seus méritos: foi uma respeitável
escritora e a primeira mulher a
ingressar na Academia Brasileira de
Letras, em 1977.
Morreu em 4 de novembro de 2003.
Embora mereça todo o nosso respeito como
intelectual, não se pode negar: daquele
triste embate entre Rachel e Blumenau,
em 1949, restaram muitas cicatrizes, embora os mais novos nunca tenham tomado conhecimento
desta história.
______________
(Fontes: Revista "Blumenau em
Cadernos", atas da Câmara Municipal
de Blumenau, edições da época dos jornais
diários "Cidade de Blumenau" e "A Nação").
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AINDA O CASO RACHEL DE
QUEIROZ.
DOCUMENTO HISTÓRICO: ATA DA
REUNIÃO DOS VEREADORES REVELA INDIGNAÇÃO DO LEGISLATIVO.
Reproduzimos a ata da
sessão da Câmara Municipal de Vereadores de Blumenau, realizada no dia 29 de
março de 1949, que foi presidida pelo vereador Guilherme Jensen.
Nela, é feita referência ao
ofício que o prefeito Frederico Guilherme Busch Jr. acabara de enviar à
escritora Rachel de Queiroz, manifestando inconformidade com a crônica que ela
escrevera na revista O Cruzeiro de 19 de março de 1949, criticando a
germanidade de Blumenau e do Vale do Itajaí.
A ata também registra o
requerimento do vereador Herbert Georg, reproduzindo o seu teor. Este
"voto de repulsa" foi enviado em seguida para a escritora, como
"reforço" ao documento que o prefeito já havia encaminhado.
Também as Câmaras Municipais
de Indaial e Brusque votaram requerimentos de protesto contra a matéria
"Olhos Azuis", publicada na revista "O Cruzeiro", pois o
ataque de Rachel de Queiroz não ficou restrito a Blumenau; estendeu-se a toda a
comunidade do Vale do Itajaí.
Esta ata está registrada no
Livro de Atas das Reuniões da Câmara Municipal de Vereadores de Blumenau, que
se encontra no Arquivo Histórico "Prof. José Ferreira da Silva".
_______________________________ADENDO
Ao
pesquisar e redigir este trabalho sobre a escritora Rachel de Queiroz, e a
refrega que houve entre ela, Blumenau e o Vale do Itajaí a partir de
1949, não tivemos a intenção de rebuscar, ou atiçar, antigas mágoas ou
cicatrizes que o fato gerou.
Apenas
narramos um fato público e notório, que faz parte da nossa história.
Porém
algumas colocações e opiniões expressas nos comentários dos internautas,
apostas no anexo, mostram que ainda restam amargas lembranças deste
episódio, ocorrido há 52 anos !
Não
é exclusividade nossa amargar pela eternidade os maus momentos que alguém
ou uma comunidade tenham vivenciado.
Que
o digam os paraguaios, até hoje, 140 anos depois, com uma derrota entalada na
garganta contra os brasileiros e a "Tríplice Aliança"! Mas a análise
cuidadosa dos depoimentos dos nossos leitores mostra que a história é imutável,
embora os seus protagonistas possam, depois, até mudar de posição, ou opinião.
Cabe
aos historiadores separar o joio do trigo.
Nós,
jornalistas, costumamos contar a história, como o fizemos neste artigo,
embasados em documentos oficiais e reportagens da época.
Infelizmente,
nem tudo são flores !
Blumenau,
04 de agosto de 2011.
Carlos
Braga Mueller/Jornalista
e escritor
Arquivo/Carlos Braga Mueller/John Pereira e
Adalberto Day